SÃO PAULO — O governador de São Paulo, João Doria (PSDB), anunciou, nesta quinta-feira, que o Instituto Butantan vai produzir uma vacina contra o coronavírus em parceria com a empresa biofarmacêutica chinesa Sinovac Biotech. A previsão é de que o imunizante esteja disponível no Brasil até junho de 2021.
O acordo prevê, inicialmente, a participação de São Paulo na realização de testes clínicos, com a disponibilização de 9 mil voluntários brasileiros a partir de julho deste ano, ao custo de R$ 85 milhões. Em seguida, explicou Doria, o Instituto Butantan estará apto também a produzir a vacina.
— Comprovada a eficácia e a segurança, o Butantan terá o domínio da tecnologia, e a vacina poderá ser produzida em larga escala para o SUS até junho de 2021 — explicou o governador, em coletiva de imprensa no Palácio dos Bandeirantes.
Mais:
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De acordo com o presidente do Instituto Butantan, Dimas Covas, há hoje no mundo 136 vacinas em desenvolvimento, sendo 10 em estudos clínicos, e um deles é essa parceria do Butantan com a Sinovac Biotech.
As fases 1 e 2 da vacina contra o coronavírus foram desenvolvidas na China, com 144 e 600 voluntários, respectivamente. A próxima fase, a ser realizada no Brasil com 9 mil voluntários, é o ensaio clínico, no qual verifica-se também eficácia, segurança e imunogeneticidade nas diferentes populações testadas.
A vacina funciona da seguinte forma: o coronavírus é introduzido em uma célula, cultivada em laboratório. Ele se multiplica, é inativado e, por fim, incorporado na vacina e aplicado na população. De acordo com Covas, o Butantan já possui a tecnologia do tipo para o desenvolvimento do imunizante:
— O Butantan já produz a vacina da dengue na mesma tecnologia. Nós já conhecemos e temos capacidade produtiva. Em um primeiro momento, ela poderá vir da China, mas depois será produzida no Butantan em larga escala.
Se a vacina se mostrar eficaz com os 9 mil brasileiros testados, ela segue para a fase de registro, junto a órgãos como a Anvisa, para, então, começar a produção nacional. A ideia é que 16 centros brasileiros de estudos clínicos já acionados pelo Butantan na confecção da vacina da dengue sejam reutilizados pa vacina contra o coronavírus.
Outras vacinas
Essa não é a única frente brasileira voltada a estudos de imunizantes contra o coronavírus no Brasil. Um grupo de 2 mil pessoas deve receber, voluntariamente, a dose de uma vacina experimental contra a Covid-19 desenvolvida pela Universidade de oxford, em parceria com a biofarmacêutica AstraZeneca.
Além disso, a empresa também anunciou acordos internacionais com a Gavi, Aliança Global para Vacinas e Imunização, grupo no qual o Brasil faz parte, abrindo portas para que laboratórios brasileiros, como Fiocruz e o próprio Butantan, possam
produzir e fornecer vacinas.
Segundo o presidente da AstraZeneca no Brasil, Fraser Hall, há ainda discussões com governos, inclusive o do Brasil, sobre quantas vacinas contra o coronavírus o país precisaria comprar.
Ao menos outras três grande instituições
trabalham para desenvolver um imunizante
, mas a escassez de recursos tem adiado os testes em humanos, fase importante para a validação da fórmula.
Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) de Minas Gerais e o Laboratório de Imunologia do Instituto do Coração (Incor) ainda não chegaram, por exemplo, à etapa dos testes pré-clínicos, em animais. Já no Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da USP, o trabalho acaba de passar da fase conceitual.
Entenda:
Instituições brasileiras trabalham para desenvolver vacinas contra o coronavírus
O Brasil atingiu nesta quinta-feira a marca de
40.276 óbitos em decorrência da Covid-19, segundo o último boletim divulgado por veículos de imprensa.
Nas últimas 12 horas, foram registrados 479 novos óbitos por coronavírus. Também foram notificadas 12.305 novas infecções, totalizando 787.489 desde o início da pandemia no país.
História
Ao falar sobre a vacina de coronavírus no Butantan, Dimas Covas disse que as grandes epidemias são momentos de "profundas crises". Lembrou que em 1988, final do século 19, a peste bubônica conectou grandes nomes da medicina e da ciência brasileira. A doença, que no Brasil teve início no Porto de Santos, no litoral paulista, era causada por uma bactéria transmitida por pulgas de animais, principalmente ratos.
À época, o chefe do serviço sanitário do porto era o paulista Emílio Ribas, que havia convidado o médico carioca Adolfo Lutz para dirigir o Instituto Bacteriológico, hoje conhecido como Instituto Emílio Ribas. Adolfo, por sua vez, chamou o mineiro Vital Brasil para ajudar a entender a doença que se alastrava por Santos.
Durante as autópsias, Vital Brasil acabou contaminado pela peste bubônica, e ficou muito mal de saúde.
— Quem veio tratá-lo foi Oswaldo Cruz, o carioca, e usou em Vital Brasil um soro roduzido por Pasteur, o francês. Isso salvou a vida de Vital Brasil. Terminada a epidemia, Adolfo Lutz convitou Vital para dirigir o Instituto Serumtherapico de São Paulo, que se tornou em 1901 o Instituto Butantan. Ele introduziu toda a produção de soros que se mantém até hoje — conta Covas.